Entrevistas C2PO

C2PO entrevista al Dr. Darshak Bhatt

Em janeiro de 2025, foi publicado na revista Scientific Reports o artigo “Oncolytic alphavirus-induced extracellular vesicles counteract the immunosuppressive effect of melanoma-derived extracellular vesicles”. O trabalho foi produzido por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade de Groningen (RUG), incluindo o Dr. Darshak Bhatt, que concluiu um programa de doutorado duplo entre a USP e Groningen.

Além de dedicar uma notícia para explicar o conteúdo do artigo, o C2PO conversou com o Dr. Bhatt para saber mais sobre sua experiência.

C2PO: Você realizou um doutorado duplo na Universidade de São Paulo e na Universidade de Groningen. Como essa experiência acadêmica e cultural única influenciou sua abordagem científica?

Dr. Darshak Bhatt: Realizar um doutorado duplo em duas instituições de prestígio — a Universidade de São Paulo, no Brasil, e a Universidade de Groningen, nos Países Baixos — foi uma experiência acadêmica e cultural singular. Minha passagem por ambas as instituições teve um impacto duradouro na minha abordagem científica e na minha visão sobre o papel do pesquisador na sociedade global.

As culturas de pesquisa na RUG e na USP eram distintas, mas complementares, e, na minha opinião, incomparáveis. No entanto, ambas enfatizavam a importância da pesquisa ética e a responsabilidade mais ampla dos cientistas, não apenas para expandir os limites do conhecimento, mas também para gerar contribuições significativas para a sociedade.

C2PO: Você mencionou que as culturas de pesquisa na RUG e na USP eram distintas, mas complementares. Como você compara suas experiências nas duas instituições e também nesses dois países?

Dr. Darshak Bhatt: Em Groningen, o ambiente era caracterizado pelo profissionalismo, eficiência e um forte foco na pesquisa interdisciplinar. Como doutorando, tive grandes responsabilidades, desde liderar meu próprio projeto de pesquisa até supervisionar estudantes. Essa abordagem de “assumir a direção” me ensinou a conduzir, gerenciar e aprimorar meu trabalho de forma eficaz. Além disso, orientar estudantes em seus projetos aprimorou minhas habilidades de mentoria e comunicação, ao mesmo tempo em que me proporcionou novas perspectivas que desafiaram minha própria forma de pensar. A estrutura horizontal no ambiente de trabalho, os recursos técnicos acessíveis e o foco no trabalho orientado por tarefas garantiam o progresso eficiente dos projetos, com ênfase na reprodutibilidade e na ciência orientada a objetivos. Em Groningen, a comunidade internacional vibrante, os sistemas acadêmicos eficientes e a cultura de inovação me inspiraram a almejar voos mais altos nos meus esforços de pesquisa. A atmosfera aconchegante da cidade e o grande equilíbrio entre trabalho e vida pessoal complementavam esse ambiente profissional, tornando-a um local ideal para o crescimento intelectual.

Por outro lado, a USP ofereceu uma experiência baseada na resiliência e na desenvoltura. Durante meu tempo lá, particularmente durante a pandemia de COVID-19, eu testemunhei de perto o espírito colaborativo dos pesquisadores brasileiros. Apesar dos recursos mais limitados em comparação aos países desenvolvidos, o foco estava em maximizar o impacto de cada experimento. Isso me embuiu de um senso de pragmatismo, levando-me a priorizar questões de pesquisa relevantes e adotar uma abordagem voltada para o aprendizado. Trabalhar em São Paulo também me fez refletir sobre a responsabilidade social da ciência — criar conhecimento que seja acessível e impactante, especialmente em regiões onde os recursos são escassos. São Paulo, portanto, foi uma lição de adaptabilidade. Conduzir pesquisa durante a pandemia trouxe desafios únicos — acesso limitado ao laboratório, interações remotas e a necessidade de otimizar estratégias. No entanto, o ambiente colaborativo da USP, marcado por um forte espírito de equipe entre colegas, transformou esses desafios em oportunidades.

C2PO: Você poderia destacar um resultado do seu tempo na USP?

Dr. Darshak Bhatt: Um dos resultados mais gratificantes dessa colaboração foi a oportunidade de ser coautor de um capítulo de um livro sobre Oncologia em português, um projeto que exemplificou o espírito de criatividade e trabalho em equipe. Traduzi meu texto do inglês para o português com a ajuda de colegas, e o livro se tornou uma contribuição valiosa para os recursos educacionais da região, promovendo acesso ao conhecimento. Esse projeto me permitiu contribuir significativamente para a comunidade acadêmica no Brasil e também aprofundou minha apreciação pelo papel da comunicação científica no fortalecimento de pesquisadores e estudantes locais.

C2PO: Qual foi o papel da mentoria na sua trajetória de pesquisa e como o apoio de seus orientadores influenciou sua abordagem aos desafios científicos e seu desenvolvimento?

Dr. Darshak Bhatt: Meus orientadores em ambas as instituições tiveram um papel fundamental na minha formação acadêmica e pessoal. A Prof.ª Toos Daemen, minha orientadora em Groningen, me incentivou a abraçar a pesquisa interdisciplinar e a abordar a ciência com racionalidade e clareza. Seu conselho — “faça uma coisa, mas faça bem” — continua sendo um princípio orientador. Ela também me ensinou a importância de considerar o público-alvo e de aprimorar continuamente meu trabalho por meio de críticas construtivas. Da mesma forma, o Prof. Roger Chammas, na USP, me ensinou perseverança, criatividade e a enxergar desafios como oportunidades de crescimento. Seu conselho pragmático — “vá em frente, é um bom exercício” — frequentemente me motivou a embarcar em novos desafios com confiança, mesmo em situações incertas. A Dra. Luciana Andrade, minha supervisora direta na USP, foi essencial na minha experiência de pesquisa. Sua expertise em vesículas extracelulares e seu incansável trabalho na condução dos experimentos do laboratório tornaram nossa colaboração altamente produtiva, resultando na publicação na Scientific Reports. Além da ciência, sou grato ao Prof. Roger e à Dra. Luciana pelo suporte na organização da minha estadia em São Paulo durante a pandemia. Sem a ajuda deles, continuar meu doutorado tão longe de casa em tempos tão incertos teria sido impossível.

C2PO: Além dos aspectos acadêmicos, como essa experiência dupla influenciou sua visão mais ampla sobre ciência, colaboração e resolução de problemas?

Dr. Darshak Bhatt: O impacto dessa experiência vai muito além da minha trajetória acadêmica. Ela moldou fundamentalmente a forma como encaro desafios científicos — combinando a abordagem ambiciosa e rica em recursos da RUG com a perspectiva pragmática e consciente dos recursos da USP. Essas experiências me ensinaram a lidar com problemas complexos equilibrando precisão, inovação e responsabilidade social. Um doutorado é frequentemente descrito como um período transformador, e para mim isso foi especialmente verdadeiro. Seja pela vibrante vida estudantil em Groningen ou pela acolhedora comunidade na USP, cada experiência adicionou uma dimensão única ao meu crescimento.

As lições aprendidas nessa jornada — colaboração, adaptabilidade e a busca por uma ciência significativa — permanecerão comigo. Acima de tudo, essa experiência reforçou a importância da colaboração internacional para o avanço da ciência e para o enfrentamento de desafios globais.

C2PO: Por fim, você mencionou os conselhos recebidos de seus orientadores e também comentou sobre a oportunidade de orientar estudantes em Groningen. Que conselho você daria a jovens pesquisadores com base em suas experiências?

Dr. Darshak Bhatt: É ótimo trabalhar em diferentes laboratórios sempre que possível, pois isso expõe o pesquisador a diversas técnicas e perspectivas, além de incentivar a reflexão sobre seus próprios vieses. Ter dois orientadores, com diferentes pontos de vista, também pode ampliar seus horizontes — embora seja importante não ter supervisores demais. Por outro lado, orientar estudantes é uma excelente oportunidade para aprimorar habilidades de comunicação e aprofundar sua própria compreensão. Por fim, é empolgante experimentar coisas novas e explorar o desconhecido. Descobertas inesperadas frequentemente levam às pesquisas mais interessantes, e quando tudo ocorre exatamente como previsto, pode ser um pouco monótono. Se tudo sair conforme o planejado, talvez não estejamos avançando para novos horizontes.

Compartilhe este conteúdo:

Outras Entrevistas